Brasil entregará medicamento para Chagas a cinco países
Laboratório público deve concluir fabricação de 4,6 milhões de comprimidos em 20 dias. País será o primeiro a fabricar o produto para uso infantil
As máquinas que produzem o medicamento para doença de Chagas Benzonidazol voltam a trabalhar a todo o vapor na próxima semana. E, dentro de 20 dias, o produto final estará pronto para atender a demanda global de 2012. Além do medicamento para uso adulto, o Brasil passa a ser o primeiro país a fabricar o Benzonidazol pediátrico, aprovado esta semana pela Anvisa. O medicamento específico para crianças vai evitar a interrupção do tratamento, comum por conta da dificuldade de manejo do produto – era preciso cortar o comprimido de adulto em oito pedaços para dar à criança infectada com a doença.
Nesta quinta-feira (1º), o laboratório privado Nortec, responsável pela produção da matéria-prima, entregou 320 kg do insumo para uso adulto e 18 kg para uso infantil ao laboratório público Lafepe, que fabricará o produto final. Serão entregues este mês 4,6 milhões de comprimidos, sendo 3,2 milhões de Benzonidazol adulto e 1,4 milhão para uso pediátrico. Ambos os laboratórios estão cumprindo o cronograma acordado em outubro entre o governo brasileiro e organismos de cooperação internacional – Organização Panamericana de Saúde (Opas) e Drugs for Neglected Deseases Initiative (DNDI) –, conforme novas demandas que surgiram da Bolívia, Colômbia, Venezuela, Argentina, Paraguai e Uruguai. O Lafepe vinha trabalhando com material em estoque para atender as demandas.
A boa notícia foi anunciada pelo secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Carlos Gadelha, durante o Encontro de Parceiros da Drug for Neglected Deseases Initiative (DNDI), realizado no Rio de Janeiro (RJ), nesta sexta-feira (2). O DNDI é uma organização sem fins lucrativos criada pelo Médicos Sem Fronteira, Fiocruz, Instituto Pasteur, dentre outros parceiros, para pesquisa e desenvolvimento de tratamentos para doenças negligenciadas. Durante o encontro, que reuniu representantes da indústria privada e instituições públicas, o secretário Gadelha discursou sobre “O papel do Brasil como força catalizadora regional e global em pesquisa para doenças negligenciadas”.
O secretário ressaltou a importância de ter matéria-prima do medicamento garantida. “Com o insumo pronto, temos a certeza de que não faltará medicamento à população. Trata-se de um produto de baixo valor e seus intermediários são de síntese complexa, o que resulta em dificuldades de oferta no mercado. E o fato de começarmos a produzir os comprimidos para uso pediátrico mostra o quanto estamos avançando na ampliação do acesso ao tratamento desta doença”, disse.
O Brasil é o único produtor mundial do Benzonidazol e, só neste ano 2011, já havia distribuído mais de 1 milhão de comprimidos do medicamento. /O Brasil tem a perspectiva de uma real cooperação global, que não vise apenas atender interesses econômicos. Não podemos ver a África pelo seu potencial comercial. Não podemos ver os outros países da América Latina como competidores. É preciso vê-los como parceiros/, afirmou Gadelha.
Desde 2008, o Lafepe usava o estoque de matéria-prima da Roche, que parou de fabricar o produto por sua baixa rentabilidade. O Brasil, então, assumiu a produção mundial. Nesse período, distribuiu 2.703.700 comprimidos do medicamento. Em abril deste ano, o estoque da Roche se esgotou. Foi quando o Ministério da Saúde articulou parceria público-privada com a Nortec para produção de matéria-prima. Enquanto o Lafepe aguardava a produção da matéria-prima, manteve estoque estratégico de 2.738 caixas do produto.
“Esse medicamento representa uma vitória no campo do enfrentamento das doenças negligenciadas. “Foi aprovado, ontem, pela Anvisa, o benzonidazol pediátrico. Isso
DEMANDA – A demanda externa anual pelo Benzonidazol cresceu 113% em relação à projeção inicialmente realizada pela Opas e DNDI. Passou de 1,5 milhão de comprimidos para 3,2 milhões – deste total, 1 milhão é para estoque estratégico. “O significativo aumento da demanda global se deve ao resultado de pesquisas que comprovaram que o medicamento beneficia não só pacientes na fase aguda, mas também os assintomáticos e na fase crônica”, explicou o secretário de Ciência Tecnologia e Assuntos Estratégicos, Carlos Gadelha.
Em outubro, 225 mil comprimidos extras foram liberados para o Médicos Sem Fronteira, para atender os casos mais urgentes. O medicamento foi remanejado do estaoque estratégico do Ministério da Saúde do Lafepe. Mais 200 mil medicamentos foram entregues em novembro.
O envio para outros países que necessitam do produto é feito a partir da Opas e do Médicos Sem Fronteira, de acordo com a demanda de cada localidade. Internamente, a distribuição é feita pelo ministério, conforme solicitação dos estados, e a estimativa de consumo é de 500 mil comprimidos por ano.
A DOENÇA – A doença de Chagas é uma doença infecciosa febril causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, que se adquire por meio do contato direto com as fezes do inseto conhecido como “barbeiro”. No Brasil, a transmissão vetorial (pelo inseto) domiciliar foi interrompida, mas predominam os casos crônicos. Estima-se que existam entre dois e três milhões de indivíduos infectados. A ocorrência de doença de Chagas aguda (DCA) no país tem sido observada principalmente em decorrência da transmissão oral, por meio de alimentos contaminados.
A doença está presente especialmente na América Latina. De acordo com relatório da OMS de 2007, nos 21 países endêmicos haviam aproximadamente 8 milhões de pessoas infectadas, o que representa uma redução de 50% em relação aos índices de 1990.
Os principais sintomas da fase aguda da doença são: febre prolongada (mais de 7 dias), dor de cabeça, fraqueza intensa, inchaço no rosto e pernas. Especialmente quando a transmissão é oral, são comuns dor de estômago, vômitos e diarréia. Devido à inflamação no coração, pode ocorrer falta de ar intensa, tosse e acúmulo de água no coração e pulmão. No local da entrada do parasita, normalmente a picada do barbeiro, em geral aparece lesão semelhante a furúnculo no local, conhecido como chagoma de inoculação.
DOENÇAS NEGLIGENCIADAS – O Brasil produz diversos medicamentos para exportação/ajuda humanitária via parcerias entre laboratórios públicos e privados: soro anti-rábico, soro anti-tetânico, soro anti-peçonha, vacina para febre amarela, vacina meningite tipo A C, Benzonidazol (doença de Chagas).
O Brasil vem investindo cada vez mais na produção nacional desses e de outros medicamentos. O investimento em laboratórios públicos produtores saltou de R$ 8,8 milhões em 2000 para mais de R$ 54 milhões em 2011.
Além disso, desde 2003, o ministério orienta grande parte de seus recursos a linhas de pesquisa relacionadas às doenças “negligenciadas”. O Brasil está no topo da lista de países que financiam pesquisa em dengue, segundo a GFinder List, instituição inglesa que realiza levantamento anual de pesquisas. De 2002 a 2010, o Ministério da Saúde financiou 518 projetos de pesquisa em doenças negligenciadas, investindo um total de quase R$ 95 milhões.
Em 2006, o Ministério da Saúde lançou o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Doenças Negligenciadas no Brasil, em parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Foram estabelecidas sete prioridades de atuação que compõem o programa em doenças negligenciadas: dengue, doença de Chagas, leishmaniose, hanseníase, malária, esquitossomose, tuberculose.
FONTE: Ministério da Saúde
http://www.saude.gov.br/