Paciente com Alzheimer convive com atrofias de área do cérebro
Estudo analisou exames de 45 pessoas com a doença atendidas no HC
Em geral, diz Balthazar, é clássico que algumas áreas do hipocampo e do córtex entorrinal estejam ligadas a problemas de memória. Nesses pacientes, aliás, estas são as primeiras áreas cerebrais afetadas na DA e no comprometimento cognitivo leve. Porém, outras áreas cerebrais relevantes para a cognição, mas menos estudadas na DA, também poderiam estar relacionadas aos sintomas dos pacientes. São os casos do tálamo, que é um conjunto de neurônios subcorticais relacionado a diferentes funções psicológicas, e do corpo caloso, que é o maior feixe de substância branca do cérebro que tem como principal função interconectar os dois hemisférios cerebrais.
A biomédica verificou a repercussão clínica da atrofia dessas áreas. Averiguou se estas estruturas estavam comprometidas (“diminuídas”) e relacionadas a problemas da memória e da linguagem. “Ela tentou estabelecer uma relação entre mente e anatomia cerebral”, afirma o neurologista.
Concluiu-se que o tálamo, hipocampos e córtices entorrinais estavam relacionados com a doença. A atrofia foi perceptível e tinha relação com os testes neuropsicológicos. Na verdade, relata o neurologista, qualquer lesão cerebral – dependendo da área do córtex – tem condições de causar comprometimento da cognição (memória, orientação, linguagem, etc.). E como a DA não é uma patologia homogênea, esclarece, ela pode trazer vários tipos de disfunção cognitiva.
Neuroimagem
Um dos aliados no diagnóstico de Alzheimer é a neuroimagem, salienta o coorientador do trabalho, área que pode contribuir decisivamente para o diagnóstico precoce e, também, para que futuros tratamentos sejam mais eficazes. O trabalho de Tatiane avaliou a anatomia cerebral tanto de áreas mais conhecidas, que denotam problemas, como de áreas menos conhecidas, justamente para analisar se elas teriam relação com a doença na fase leve ou até mesmo numa fase anterior, quando ocorre um comprometimento cognitivo leve. Entre essas alterações, estão as anatômicas, típicas dessa doença ainda na fase pré-demência.
O benefício da neuroimagem no estudo, de acordo com Tatiane Pedro, foi ter ajudado a investigar padrões de atrofia que podem acometer muitos pacientes com DA, além de descartar outras patologias. Esse método tem por finalidade detectar áreas cerebrais que podem estar precocemente comprometidas – no caso deste estudo, por meio da anatomia. “É que o volume das estruturas nessa doença tende a ser menor. Mas isso não ocorre no cérebro todo. Há áreas, no início, que são menores que outras e que, no decorrer da doença, diminuem mais ainda. Seria, portanto, interessante encontrar um biomarcador de neuroimagem – exame que detectaria a doença da forma mais precoce possível – para ser utilizado na prática clínica”, assinala Balthazar.
‘Não existe ainda um exame definitivo’
A DA ocasiona disfunções em diferentes níveis de organização cerebral: desde moleculares, com disfunção das proteínas beta-amiloide e tau, em redes neurais, na anatomia e, por fim, afetando a mente, principalmente a memória dos pacientes. É possível investigar essas disfunções nesses diferentes níveis, buscando sempre um diagnóstico mais precoce e preciso. “Tudo em conjunto aumenta muito a sua sensibilidade e especificidade, porém não existe ainda um exame definitivo”, garante Balthazar.
Ele revela que as pesquisas sobre DA possuem duas vertentes: o tratamento, para compreender a fisiopatologia do problema e poder criar novos fármacos; e a realização do diagnóstico precoce com base em biomarcadores. “Isso implica encontrar um ou mais exames, quer por neuroimagem, sangue ou líquor, que aumentem a capacidade de detectar a doença antes que esteja disseminada”, dimensiona.
Biomarcadores já têm sido estudados por outros países. No Brasil, o grupo da Unicamp está inserido, por exemplo, no Programa Jovem Pesquisador em Centros Emergentes da Fapesp, que deve ter início no ano que vem. O projeto será desenvolvido por Balthazar, avaliando-se algumas alterações patológicas da DA no líquido cefalorraquidiano, no sangue e em novos métodos de análise de ressonância magnética. O trabalho será desenvolvido pelo grupo de Neuropsicologia e o Laboratório de Neuroimagem, coordenados, respectivamente, pelos professores Benito Damasceno e Fernando Cendes.
O estudo será efetuado em parceria com o Instituto de Biologia (IB). No Laboratório de Neuroimunologia, coordenado pela professora Leonilda Santos, serão estudados marcadores inflamatórios e características das proteínas beta-amiloide e tau, entre outros. Caberá ao Laboratório do professor Alexandre Oliveira, também do IB, pesquisar se uma das proteínas do líquor dos pacientes inibe as sinapses, que faz a ligação entre os neurônios.
Memória e cognição são afetadas
A DA é uma doença cerebral degenerativa caracterizada por um comprometimento cognitivo secundário à atrofia progressiva, com perda das habilidades de pensar, raciocinar, memorizar, da linguagem e causar alterações de comportamento. A falta de memória para guardar fatos novos é a principal característica da doença. A memória remota, enfatiza Balthazar, em geral é preservada no começo, embora tenda a se deteriorar com a progressão da doença. Para o diagnóstico de DA é necessário que haja comprometimento cognitivo ou psiquiátrico e que isso seja de monta suficiente para interferir na vida sócio-ocupacional do indivíduo.
Acima dos 65 anos, 1% da população mundial tem este diagnóstico. A cada cinco anos de envelhecimento, esse percentual dobra, chegando a cerca de 45% da população acima de 85 anos. “Quanto mais velha a população, mais gente é acometida”, situa o neurologista.
Atualmente, há disponíveis duas famílias de drogas mais indicadas para essa enfermidade: as primeiras, para a fase leve ou moderada, são os anticolinesterásicos (rivastigmina, galantamina e donepezila); e, para a fase moderada a avançada, uma quarta droga é a memantina. A notícia ruim é que essas drogas não melhoram a doença. Tendem a estabilizar o quadro, tornando o processo mais lento do que quem não as usa.
■ Publicação
Tese: “Atrofia de corpo caloso, tálamo, hipocampo e córtex entorrinal em pacientes avaliados por doença de Alzheimer e comprometimento cognitivo leve amnésico”
Autora: Tatiane Pedro
Orientadores: Fernando Cendes e Márcio Luiz Figueredo Balthazar
Unidade: Faculdade de Ciências Médicas
FONTE: UNICAMP
http://www.unicamp.br/