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Ingestão excessiva de sucos de frutas tropicais pode causar erosão dental

Experimentos desenvolvidos na FOP mediram o pH e analisaram índices de acidez

Frutas tropicais como camu-camu, araçá-boi, cupuaçu, taparebá e umbu são consumidas pela população do Norte e do Nordeste brasileiros. Uma avaliação realizada pela cirurgiã-dentista Adelsilene das Graças Cavalcanti Veras, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP) da Unicamp, em sua tese “Avaliação do potencial erosivo de sucos de frutas tropicais brasileiras”, mostra que o consumo em demasia dessas delícias pode causar erosão nos dentes. A pesquisa teve como objetivo avaliar sucos dessas frutas quanto ao potencial para causar erosão dental.

Ao expor pedaços de dentes bovinos a cada um dos sucos já preparados, in vitro, foi possível observar a capacidade dos sucos de causarem perdas da superfície dos dentes, segundo a orientadora da tese, a professora Cínthia Pereira Machado Tabchoury. A partir das amostras de sucos, as pesquisadoras mediram o pH dos produtos e fizeram análise da acidez titulável, usada para ver o quanto o suco pode manter o pH baixo. Segundo Cínthia, também foi avaliada a quantidade de cálcio presente nos sucos, que pode ajudar a prevenir a erosão dental.

De acordo com a docente, a erosão dental é uma patologia bastante relacionada à forma que a pessoa utiliza as bebidas e os alimentos. O simples fato de consumir não causa a erosão, mas depende sim da forma e da fre-quência de uso. “Algumas pessoas têm um grande consumo de sucos ou refrigerantes. Outras têm hábitos como bochechar a bebida antes de deglutir, ou, por exemplo, ficar trabalhando ao computador tomando a bebida aos poucos. São hábitos que podem levar à erosão”, informa Cínthia. Ela explica que no momento em que o suco entra em contato com o dente, ele promove um ataque ácido. Isso leva à perda imediata de minerais do dente.

Além da análise in vitro, as pesquisadoras realizaram uma avaliação em que voluntários eram orientados a colocar uma quantidade de suco na boca e cuspir. De tempo em tempo, a saliva era coletada para avaliação e, de acordo com a professora, apresentando bastante acidez. Segundos depois, a saliva já lava o suco e o ácido e ainda repõe os minerais perdidos, mas o ataque já foi feito, segundo Cínthia. Ela esclarece que os testes foram feitos com pessoas saudáveis, mas os resultados poderiam ser diferentes em pessoas com o fluxo salivar comprometido.

Segundo Cínthia, os sucos são consumidos por sua importância relacionada à saúde, pois as frutas são ricas em algumas substâncias. O camu-camu, por exemplo, é conhecido pelo alto conteúdo de vitamina C. Sendo assim, ela antecipa que a pesquisa não ignora os benefícios das frutas, mas mostra que alguns cuidados devem ser tomados para evitar a erosão dental. “Elas merecem atenção, dependendo da pessoa e da forma de uso”, acrescenta.

As polpas, adquiridas no Inpa, órgão responsável pelo controle das frutas, foram diluídas na mesma quantidade de água e não foi realizada pesquisa sobre o consumo in natura. Ela manifesta o interesse em dar continuidade à pesquisa realizando novos estudos mais próximos das condições normais dos indivíduos.

Cínthia explica que o processo de erosão e da cárie dental é muito diferente. Segundo a professora, na cárie, o açúcar consumido vai ser utilizado pelas bactérias que ficam na placa dental e vão produzir ácido. Este ácido pode fazer com que o dente perca mineral. No caso da erosão, o ácido é de origem exógena ou endógena, e não aquele produzido por bactéria. Ele pode ser de um alimento ou ainda proveniente de refluxo gastresofágico ou de pessoas com bulimia ao provocar o vômito. O ácido que retorna do estômago, segundo Cínthia, também provoca o ataque na superfície do dente. “No caso da cárie deve haver placa dental sobre os dentes. No caso da erosão, não há placa, pois ela servirá como proteção sobre o dente. Ainda, a escovação provoca o processo chamado abrasão. O ácido que atacou o dente deixará aqueles minerais amolecidos. Na escovação removem-se mais ainda aqueles minerais.”, explica Cínthia.

Sucos infantis

De acordo com a literatura, o consumo de sucos por crianças tem sido recomendado por alguns profissionais da área de saúde em substituição aos refrigerantes. Com isso, de acordo com alguns estudos, as crianças começam a ingerir essas bebidas cada vez mais cedo. Na vida moderna, muitos pais recorrem a sucos prontos, com motivos infantis na embalagem, mas não atentam para o valor de pH, que pode estar entre 4,0 e 7,0. Em outra pesquisa orientada por Cínthia, a aluna Lenita Marangoni Lopes utilizou dentes decíduos (de leite) para testar o potencial erosivo de sucos com apelo infantil encontrados nas prateleiras do mercado.

De acordo com Cínthia, o trabalho de conclusão de curso de graduação, intitulado “Avaliação in vitro do potencial erosivo de sucos infantis em esmalte decíduo”, apresentou uma grande diversidade de resultados, pois alguns sucos com pH bem baixo, quando aplicados em dentes de leite, promoveram perda mineral num valor considerável. Enquanto outros já não levaram a essas perdas. “Sendo assim, ficou difícil afirmar com certeza o que levou à erosão. O pH do suco é bom indicativo, mas muitos deles tinham boa quantidade de cálcio, o que pode ter diminuído as perdas”, explica. O estudo abre portas para outras avaliações, segundo Cínthia.

A análise foi feita com dentes de leite por serem mais suscetíveis a perdas minerais pela sua própria composição. Isso permitiu que a análise se aproximasse mais fielmente da cavidade bucal, já que foi realizada com dentes de humano.

A professora enfatiza que já existem relatos na literatura de que dentes de leite apresentam erosões. Ela explica que como diminuiu a prevalência da cárie, os dentistas ou as pessoas começam a prestar mais atenção em outras patologias da cavidade bucal, e a erosão está entre os temas que passaram a chamar atenção. Ela informa que, nas últimas décadas, aumentou muito o consumo de refrigerantes e sucos.

Segundo Cínthia, o aumento de casos de erosão ainda é um tema controverso, com algumas pesquisas mostrando um aumento na prevalência. Entretanto, pondera, outros estudos ainda são necessários. “Mas, de qualquer forma, é importante que se estude e trace estratégias preventivas para esta patologia”, acentua.

■ Publicações
Tese: “Avaliação do potencial erosivo de sucos de frutas tropicais brasileiras”
Autora: Adelsilene das Graças Cavalcanti Veras
Orientadora: Cínthia Pereira Machado Tabchoury
Unidade: Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP)

Trabalho de conclusão de curso: “Avaliação in vitro do potencial erosivo de sucos infantis em esmalte decíduo”
Autora: Lenita Marangoni Lopes
Orientadora: Cínthia Pereira Machado Tabchoury
Unidade: Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP)

FONTE: UNICAMP
http://www.unicamp.br/