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Palavra da Presidenta

thumbnail_1371841662Uma lição que vem lá de Botucatu/SP

por Valdelice Teodoro*

Dia desses, conversava com meus assessores sobre uma lei sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, recentemente, que obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) a iniciar o tratamento de pacientes com câncer em, no máximo, 60 dias. Conversava sobre o quanto a medida era paradoxal, por saber, como profissional das técnicas radiológicas com larga experiência na área de Radioterapia que, tão importante quanto o prazo de início do tratamento, é a forma que o paciente será tratado.

Em suma, significa dizer que não adianta iniciar o tratamento em tempo hábil, se a terapia escolhida não for adequada ou não tiver como objetivo a melhora ou cura do paciente. Fazer por fazer, só para dizer que ofereceu o tratamento, não vai resolver o problema da oncologia no Brasil ou tornar o SUS um programa bom por excelência. Parece-me bastante contraproducente que a classe política responda aos anseios populares baixando normas moralizadoras e determinando prazos para tratamentos, sem que, para isso, ofereça condições mínimas para que as equipes multiprofissionais de saúde possam desenvolver suas atividades. Infelizmente, isso se tornou regra.

A ver, gostaria de emprestar essa reflexão para trazer à tona a decisão da Justiça Federal do Estado de São Paulo nos autos do processo n.º 0005295-79.2013.4.03.6131, em que se discute a incompetência dos profissionais da Biomedicina para desempenhar atividades na área das técnicas radiológicas. Atendendo a dezenas de denúncias, oCONTER entrou com uma ação pedindo antecipação de tutela, a fim de evitar que o concurso fosse realizado irregularmente. O juizado entendeu que o atendimento às pretensões do CONTER implicaria no impedimento da abertura de um hospital e, por isso, decidiu frustrar nossas expectativas, sob a justificativa de que aquela comunidade seria prejudicada.

Na cabeça do juiz, ele deve estar certo. Na nossa concepção, não, ao passo que não adianta abrir um hospital sem infraestrutura e profissionais devidamente qualificados. Não adianta cumprir prazos de forma precária. Uma unidade de saúde sem material humano competente é como um barco sem leme.

Infelizmente, na prática, o que se verá é a inauguração de mais um centro de saúde que não cumprirá sua função social. Todavia, não nos causa espécie a decisão da JF-SP. Neste tipo de processo, quase nunca se defere liminar. A coisa é resolvida na fase de recurso, mesmo. Por isso, vamos entrar com um Agravo de Instrumento no TRF 3ª Região, no decorrer da semana que vem, pois estou convicta dos nossos argumentos e vou lutar por eles, em nome de toda a categoria dos profissionais das técnicas radiológicas. Se necessário, levaremos a questão até o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Fedederal (STF).

Ora, se um biomédico não pode assumir vaga de biólogo, mesmo tendo a profissão regulamentada pela mesma legislação (Lei n.º 6.684/79), como poderia assumir vagas de Técnicos e Tecnólogos em Radiologia, que são regulados por um outro conjunto normativo (Lei n.º 7.394/85)? Perdoem-me, mas é invasão de prerrogativa, usurpação de atividade, prejuízo à saúde e crime que lesa a pátria.

Lembro bem das recentes decisões do STJ, em que esclarece que biomédico não pode atuar como biólogo (REsp 1331548), ainda que criados pela mesma lei, bem como Psicólogo não pode exercer acupuntura (REsp 1357139), ainda que tenha a prática livre no Brasil, mas pelo fato simples de que resolução de conselho profissional não pode atribuir competência que a lei não prevê.

O que me indigna como profissional e como gestora é o fato de que não há dúvida de que a competência para supervisão das aplicações das técnicas em radiologia em todos os setores de radiodiagnóstico, radiotepraia, radioisotópicos, industrial e medicina nuclear é do Técnico e Tecnólgo em Radiologia, ou seja, não há como outro profissional sem atribuição, competência ou capacidade profissional lhe usurpar esse direito.

Infelizmente, até então, a maioria dos magistrados não consegue compreender o que representa para a sociedade o exercício ilegal das técnicas radiológicas. Não conseguiram assimilar os argumentos que dão conta dos problemas decorrentes da manipulação imprecisa da radiação ionizante. Somente quando alcançarem o assunto pelo viés científico, como uma parte dos magistrados já fazem, conseguirão decidir com propriedade sobre os problemas da Radiologia no Brasil. Para tanto, temos Ações Civis Públicas sobre a questão em todas as regiões brasileiras e vamos dar a oportunidade do poder judiciário desfazer uma injustiça social que vem sendo acometida ao longo dos últimos dez anos contra os profissionais das técnicas radiológicas.

Por essas e outras, não é à toa que a maioria dos brasileiros não se sinta mais representada pela maioria dos poderes constituídos e esteja nas ruas, protestando por uma realidade melhor. A distância que existe entre as decisões e a vontade e necessidade do povo é abismal e não pode continuar.
Por essas e outras, nós vamos continuar fazendo diferente e lutando por um país justo e legal, com uma população que respeite as leis que regulam profissões.

Temos que ter paciência. O que nos parece evidente, não é claro para a sociedade em geral. A maioria ainda está perdida numa cortina de fumaça que há de se desfazer, diante da nossa persistência em esclarecer as nuances mais específicas da profissão.

Temos de ser perseverantes, pois não será fácil continuar combatendo a invasão arbitrária que ocorre na área das técnicas radiológicas, hoje, por parte dos biomédicos.

Mas valerá a pena combater o bom combate, sobretudo tendo a ciência de que podemos irradiar nossas prerrogativas para garantir respeito e identidade.

NÃO NOS CALARÃO!

*presidenta do CONTER

FONTE: CONTER
http://www.conter.gov.br