Saúde Pública: ano de 2012 fecha com 119 reimplantes realizados
Programa do Governo do Estado completa cinco anos com média de 80% de sucesso nos procedimentos
Um dos programas que representa a excelência do atendimento altamente especializado realizado em algumas das unidades de saúde estaduais, o SOS Reimplante, que funciona dentro do Hospital Estadual Adão Pereira Nunes (HEAPN), em Saracuruna, completa cinco anos em 2013. Desde sua criação, foram realizados 314 procedimentos em vítimas de acidentes graves, sendo 119 reimplantes, 31 somente em 2012. O índice de sucesso das cirurgias fica em torno de 80%.
O projeto começou com a história da menina Ana Catarina que em dezembro de 2008 teve o braço direito amputado enquanto tentava tirar roupas de uma máquina de lavar industrial no abrigo onde morava, em Areal. O microcirurgião João Recalde recebeu uma ligação do secretário de Estado de Saúde, Sérgio Côrtes, com o pedido urgente para se deslocar com sua equipe para o HEAPN e tentar reimplantar o membro da menina, na época com 10 anos. Ela foi transferida de helicóptero para a unidade e, menos de quatro horas depois do acidente, estava na mesa de cirurgia. O sucesso do procedimento foi o pontapé inicial para a criação do programa, único que oferece esse tipo de atendimento no estado.
– No Adão Pereira Nunes, além de contar com essa equipe exclusiva, estamos dentro de uma estrutura voltada para emergência, atendendo pacientes muito graves. Os casos que surgem na rede privada volta e meia esbarram na burocracia da autorização do convênio e isso, algumas vezes, vai de encontro à urgência da operação. Não dá para, no meio de uma tragédia como essa, discutir questões financeiras com o paciente ou a família. No serviço público, vencemos toda essa burocracia – explica Recalde, coordenador do programa, que lembra que cerca de 70% dos casos são de trabalhadores que se acidentam no ambiente de trabalho, 90% das vezes nos membros superiores.
Além dos reimplantes, a equipe que trabalha exclusivamente para o programa na unidade realiza cirurgias de nervos e tendões, enxerto de ele, cirurgia óssea, entre outros procedimentos.
Nesses quase cinco anos de programa, o caso que mais marcou Recalde foi o do menino Lucas de Oliveira. Em dezembro de 2010, Lucas, na época com 10 anos, foi atropelado na porta da casa do avô, em Xerém, e teve a perna direita esmagada. As chances de sucesso do reimplante eram de apenas 30%, mas Lucas superou o prognóstico inicial e, dois anos depois, já recuperou quase todo o movimento do membro.
– Esse foi um caso limite que nos surpreendeu muito. Não há nada que pague ver o paciente retomando sua vida. O médico, em princípio, é um idealista e tem o ideal de fazer o bem à população de baixa renda, a pessoas que não têm acesso à medicina de ponta. Por isso, sempre acreditei e desejei que o reimplante fosse oferecido pelo serviço público, pois lá está a grande maioria dos casos – comenta o médico.
Terapia ocupacional – Complementando o atendimento oferecido pelo SOS Reimplante está o setor de Terapia Ocupacional, que visa permitir que os membros reimplantados, especialmente da mão, voltem a ter função, possibilitando, com isso, que o paciente tenha uma vida normal. À frente desse trabalho está o terapeuta ocupacional Ivens Pereira, especializado na reabilitação dos movimentos da mão e que vem implantando o uso de objetos do dia a dia como massa de modelar, miçangas e tachinhas no tratamento dos pacientes do programa. Além disso, Ivens foi responsável por adaptar, por exemplo, a órtese de neuropraxia de radial, muito usada nos casos que antes era grande e pesada, causando incômodo ao paciente, para uma versão menor e mais prática de se colocar e tirar.
Órteses são apoios ou dispositivos externos aplicados ao corpo para modificar os aspectos funcionais ou estruturais do sistema neuromusculoesquelético para obtenção de alguma vantagem mecânica ou ortopédica. Elas são utilizadas quando há paralisia temporária do movimento.
– A finalidade da Terapia Ocupacional aqui no hospital é evitar sequelas do acidente e novas cirurgias. O objetivo é que o paciente volte a trabalhar e tenha uma vida próxima da que tinha antes o mais rápido possível. A Terapia Ocupacional é o uso da vida diária para recuperar o movimento do indivíduo. Por isso, criamos situações que o paciente possa fazer também em casa para ajudar nessa recuperação. Mostro o que ele tem ou não condição de fazer e ele treina aqui e repete em casa. Nosso maior desafio é promover desafios que o paciente possa superar. Com isso, lidamos também com o fator emocional. Não adianta criar um desafio que ele não possa cumprir porque senão a autoconfiança dele vai lá embaixo – afirma Ivens.
Há quase um ano afastada do trabalho como professora de uma creche por conta de um acidente com uma porta de vidro, Mariane Pereira, de 20 anos, moradora de Caxias, vem passando por uma lenta recuperação. Ao fechar a porta, sua mão e punho atravessaram o vidro, cortando profundamente a região e rompendo tendão, ligamentos, veias e nervos, comprometendo toda a estrutura da mão. Agora, 11 meses após o acidente, Mariane já recuperou praticamente todos os movimentos.
– Estou usando uma órtese há alguns meses para forçar o movimento da região. Já consigo pegar objetos, abrir e fechar a mão. Antes tinha muita dificuldade pra fazer coisas do dia a dia como amarrar o sapato, tomar banho. As pessoas não têm noção da gravidade, acham que foi apenas um corte no meu punho. Vou fazer outra cirurgia em janeiro para soltar o movimento de um dedo que ficou um pouco enrijecido. Não vejo a hora de poder voltar a cuidar dos meus alunos e mexer no computador – conta Mariane.
Como socorrer a vítima – Ao socorrer a vítima de amputação traumática de extremidades, um dos pontos mais importantes é acondicionar de forma correta o material amputado, que deve ser mantido a 4ºC. A maneira mais simples para isso é colocar a parte amputada em um saco plástico resistente, lacrar com fita adesiva e colocá-lo em um ambiente com água e gelo picado, distribuídos meio a meio, como numa caixa de isopor. Quanto mais rápido o paciente chegar ao hospital, melhor. Para ser realizada com sucesso, a cirurgia de reimplante deve ser feita em até seis horas após o acidente.
Como é o tratamento – Uma vez feita a cirurgia, após a alta, o paciente é acompanhado no ambulatório para troca de curativos, retirada de pontos e, quando necessário, do material de fixação dos ossos. A segunda fase da recuperação é o atendimento pela terapia ocupacional para iniciar a reabilitação funcional. Em geral, o acompanhamento leva de quatro a seis meses, que é o tempo necessário para a recuperação total.