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Ser mãe é um direito

Profissional gestante tem direito a afastamento da função sem redução de salários e benefícios

“O que era para ser pura felicidade, se tornou motivo de tortura e perseguição. Estou disposta a me expor, para garantir o direito de outras mulheres que estejam na mesma condição que eu. Espero que paguem por cada lágrima que já derramei”. O desabafo é da Técnica em Radiologia Neliane Costa Mendes, que trabalha no Hospital Municipal de Carnaubal/CE há seis anos. Nossa personagem tem de 29 anos e acaba de descobrir que será mamãe. 

Desde a comunicação de sua gravidez, em 22 de novembro de 2012, Neliane foi afastada de sua função e das fontes de radiação ionizante, como bem manda as normas de proteção radiológica. Contudo, isso se deu da pior forma possível.

De acordo com a denúncia que chegou ao Conselho Nacional de Técnicos em Radiologia (CONTER), na segunda-feira subsequente à comunicação da gravidez, a profissional compareceu normalmente ao local de trabalho, com o objetivo de saber para onde seria remanejada. Por volta das 16 horas, ela recebeu um documento informando que, no dia 27 de novembro de 2012, deveria comparecer à Secretaria Municipal de Saúde para obter essa informação. Pois bem. Na ocasião, foi informada pela Secretária de Saúde do município que sua nova função seria de Digitadora e, por se tratar de uma disfunção de cargo, teria que trabalhar 44 horas semanais, por um salário mínimo e sem direito ao adicional de 40% por insalubridade.

De acordo com a presidenta do CONTER Valdelice Teodoro, com base nas informações oferecidas pela denunciante, os responsáveis já foram notificados sobre as irregularidades e receberam todas as informações necessárias para resolver a situação. Caso não adotem as recomendações, o CONTER tomará as medidas legais que couberem ao caso. “Sempre que me deparo com episódios como este fico sensibilizada. É um crime desamparar uma mulher no momento da vida em que ela mais precisa de apoio e compreensão. O dever de dar assistência a uma funcionária gestante é mais que uma obrigação legal, é uma obrigação moral”, afirma.

Mas… e o que diz a lei?
A proteção dos direitos da trabalhadora gestante preserva a opção da mulher decidir livremente o momento em que deseja engravidar e realizar o planejamento familiar, sem a interferência do empregador.
Inicialmente, quando da descoberta da gravidez, a profissional deve notificar o contratante, conforme disciplina asDiretrizes de Proteção Radiológica em Radiodiagnóstico Médico e Odontológico, instituída pela Portaria ANVISA n.º 453/98:

2.13 Exposições ocupacionais
b) Para mulheres grávidas devem ser observados os seguintes requisitos adicionais, de modo a proteger o embrião ou feto:
(I) a gravidez deve ser notificada ao titular do serviço tão logo seja constatada;
(II) as condições de trabalho devem ser revistas para garantir que a dose na superfície do abdômen não exceda 2 mSv durante todo o período restante da gravidez, tornando pouco provável que a dose adicional no embrião ou feto exceda cerca de 1 mSv neste período.

Junto com a comunicação oficial, é recomendável que a funcionária anexe a legislação que garante a manutenção dos direitos sociais e trabalhistas durante o afastamento, ao passo que é vedada a redução de salários e benefícios, bem como o aumento da carga horária de Técnicas em Radiologia gestantes, independente de a nova ocupação temporária ser insalubre ou não.

De acordo com o Artigo 16º da Lei n.º 7.394/85 e com os dispositivos abaixo discriminados da Lei n.º 1.234/50, o rendimento mínimo de um profissional das técnicas radiológicas não pode ser inferior a dois salários mínimos mais 40% sobre este valor, que diz respeito à insalubridade inerente ao exercício da profissão. Esse é um direito adquirido, que não cessa em qualquer hipótese, como se pode observar:

Lei n.º 7.394/85:
Art. 16 – O salário mínimo dos profissionais que executam as técnicas definidas no Art. 1º desta Lei será equivalente a 2 (dois) salários mínimos profissionais da região, incidindo sobre esses vencimentos 40% (quarenta por cento) de risco de vida e insalubridade.

Lei n.º 1.234/50:
Art. 1º Todos os servidores da União, civis e militares, e os empregados de entidades paraestatais de natureza autárquica, que operam diretamente com Raios X e substâncias radioativas, próximo às fontes de irradiação, terão direito a:
a) regime máximo de vinte e quatro horas semanais de trabalho;
b) férias de vinte dias consecutivos, por semestre de atividade profissional, não acumuláveis;
c) gratificação adicional de 40% (quarenta por cento) do vencimento.
Art. 4º Não serão abrangidos por esta Lei:
a) os servidores da União, que, no exercício de tarefas acessórias, ou auxiliares, fiquem expostos às irradiações, apenas em caráter esporádico e ocasional;
b) os servidores da União, que, embora enquadrados no disposto no artigo 1º desta Lei, estejam afastados por quaisquer motivos do exercício de suas atribuições, salvo nas casos de licença para tratamento de saúde e licença a gestante, ou comprovada a existência de moléstia adquirida no exercício de funções anteriormente exercidas, de acordo com o art. 1º citado.

É relevante destacar que, durante o período de afastamento das fontes ionizantes por motivo de gravidez, não pode haver prejuízo de remuneração, pois o Parágrafo VI do Artigo 7º da Constituição Federal veda a redutibilidade salarial nesses casos. Da mesma forma, o Parágrafo IV do Artigo 392 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) proíbe que haja prejuízo dos salários e demais direitos da trabalhadora gestante:

Constituição Federal de 1988:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo.

Artigo 392 da CLT:
§ 4º É garantido à empregada, durante a gravidez, sem prejuízo do salário e demais direitos (Redação dada pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999):
I – transferência de função, quando as condições de saúde o exigirem, assegurada a retomada da função anteriormente exercida, logo após o retorno ao trabalho  (Incluído pela Lei nº 9.799, de 26.5.1999).

Vale frisar que, de acordo com o item 32.4.4 da Norma Regulamentadora 32 (NR32), que dispõe sobre segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde, “toda trabalhadora com gravidez confirmada deve ser afastada das atividades com radiações ionizantes, devendo ser remanejada para atividade compatível com seu nível de formação”. Portanto, não é prudente que haja uma espécie de rebaixamento de cargo, como se denota da maioria desses casos.

FONTE: CONTER